Por José Sarney
Fez parte das articulações para conter as resistências, na área militar, à candidatura de Tancredo Neves, um encontro dele com o então Ministro do Exército, General Walter Pires.
Ficou encarregado de fazer esse contato e articular a reunião o Secretário da Receita Federal, Francisco Dornelles — depois ministro, senador, governador —, que tinha boas relações com o general. Foi tudo organizado em sigilo absoluto, de forma que ninguém jamais soubesse desse encontro, que não teria boa repercussão em nossas hostes.
Feito o agendamento, Tancredo foi visitar o General Walter Pires em sua residência. Quando desceu do apartamento do general, Tancredo viu que um número considerável de jornalistas o aguardava embaixo do prédio, indicando que haviam descoberto aquele encontro e até a hora da visita de Tancredo.
Ao sair do elevador, um jornalista perguntou a Tancredo: “Dr. Tancredo, como foi a conversa com o General Walter Pires?”
Tancredo respondeu-lhe, sem vacilar: “Ele mora aqui?”
Dito isso foi saindo, e todo mundo começou a gargalhar e louvar a agilidade mental do nosso candidato.
Tancredo Neves contou essa história na casa do Ulysses, em minha presença e na de Zé Aparecido, Aluízio Alves, Renato Archer e Dona Mora. Quando ele acabou de contar a façanha, Dona Mora argumentou: “Mas, Dr. Tancredo? Se o Aluízio e o Aparecido sabiam dessa visita, o senhor achava que a imprensa também não iria saber? Lembrese da lei do Golbery: ‘Segredo só não conta quem não sabe!’”
Em outro dia, Tancredo, numa tarde em sua casa, com Thales Ramalho, Affonso Camargo e Aecinho, perguntou: “Vocês, que são muito sabidos, digam: quem será o meu Chefe da Casa Civil?
Thales Ramalho respondeu-lhe: “José Hugo Castelo Branco.”
Aí Tancredo exclamou: “Antônia me traiu!”
E Thales explicou: “Não, Tancredo, quem, como eu, o conhece sabe que deve ser escolhido um homem habilidoso, que também o conheça e a Minas Gerais, que tenha boas relações com sua família, além de ser do seu jeito. Já que somos os sabidos, a minha sabedoria me diz que vai ser o Zé Hugo. Não culpe a Antônia disso não.”
Por outro lado, o Affonso Camargo, que tinha tido uma atuação proeminente em favor de Tancredo dentro do PMDB, também desejava ser o Chefe da Casa Civil. Desconfiando de que o Tancredo já o tinha escolhido para Ministro dos Transportes e querendo reverter a situação, disse a Tancredo: “Tancredo, eu só não quero o Ministério dos Transportes.”
Achava que, com isso, levaria Tancredo a escolhê-lo para a Casa Civil. Mas Tancredo disse-lhe: “Não, tenho uma missão especial nessa área de transporte e só tem um homem capaz de assumir essa responsabilidade: você! Você será o Ministro dos Transportes.”
O Affonso Camargo ficou meio murcho, mas sentiu que Tancredo já tinha feito o que planejara: escolhera o Zé Hugo para a Casa Civil.
Havia também uma grande pressão para o Ministério do Interior. O pessoal do Nordeste, comandado pelo grupo pernambucano, queria indicar o ministro. Mas havia uma reação do Ulysses e de grande parte do Grupo Autêntico do PMDB.
Quando a confusão se estabeleceu e Ulysses levou a Tancredo o nível da divergência, Tancredo respondeu-lhe: “Ulysses, enquanto vocês discutem, eu ponho o Ronaldo Costa Couto lá… até vocês se entenderem.”